Você sabe como funciona um cinema?

Depois de um breve levantamento sobre a evolução dos espaços de cinema ao longo da história, chegou a hora de compreender melhor como funciona esse espaço de cinema.

Um projeto de um cinema é um tema um tanto quanto complexo na arquitetura, pois envolve muitos conhecimentos de acústica, projeção e visualização além de um grande emaranhado de circulações e espaços que se sobrepõem a fim de ter o melhor aproveitamento possível, isso sem contar todas as instalações de ar-condicionado, cabos, aparelhos de som, entre outros equipamentos que não abordaremos a fundo nesse artigo.

Como vimos no artigo anterior, atualmente grande parte dos cinemas são construídos juntos a shopping centers e tornaram-se parte fundamental destes. Em geral para acomodar o complexo de cinema o Shopping Center constrói uma grande caixa vazia com dimensões próprias para se construir as salas dentro dela:

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Inserimos a arquibancada com as paredes e o forro que envolverão a sala dentro desse espaço:

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Completamos a sala com a sala ou cabine de projeção, tela, caixas de som, poltronas e o que mais for necessário para o funcionamento e conforto de uma boa sala de cinema:

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Porém e os espaços para banheiros, bomboniere, bilheteria e todos os demais espaços que são necessários para o seu funcionamento? Ficam em outro espaço separado dessa grande caixa vazia fornecida pelo Shopping? Não, na verdade em todos os cinemas boa parte do espaço, ou todo ele, que não corresponde à sala de exibição propriamente dita, ocorrem abaixo das arquibancadas, veja o próximo desenho:

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Então agora você já sabe, toda vez que estiver circulando por corredores ou pelo foyer do cinema pode ter quase certeza que uma arquibancada estará acima de você.

Porém um dos aspectos mais fascinantes em um projeto para complexo de cinema são as soluções acústicas. Já imaginou você estar assistindo a um filme de romance e em algum momento começar a escutar explosões da guerra que ocorre no filme de ação da sala ao lado? Provavelmente essa não é uma experiência que alguém quer experimentar quando for assistir a um longa-metragem. Para resolver esse problema, muito mais do que simplesmente aplicarmos materiais acústicos para barrar ou absorver o som, utilizamos um conceito chamado de “box-in-box” (caixa dentro da caixa). Se voltarem na imagem acima notarão que as paredes, o teto e o piso das salas estão totalmente separados da “grande caixa” do shopping. Isso é necessário porque o som não se propaga apenas pelo ar, mas também pela vibração das paredes e estruturas. Veja no desenho abaixo como ficam então as várias salas quando estão lado a lado com o conceito box-in-box:

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Notem que cada sala possui suas próprias paredes, independentes e separadas uma das outras. Como elas não se tocam eliminamos boa parte do som que seria transmitido pela vibração dos materiais.

Outra parte de um projeto de cinema que sempre chama muito a atenção e curiosidade de todo mundo são os projetores e as telas aonde são projetadas as imagens. A tecnologia evoluiu muito nos últimos anos, saímos da película, que ainda é encontrada em muitos cinemas, e fomos aos projetores totalmente digitais cujos filmes são enviados via satélite diretamente para o HD do projetor. Com os projetores digitais, dispensando todo o trabalho que os rolos de película proporcionam, muitas salas de projeção foram reduzidas a pequenas cabines não muito maiores do que o espaço necessário para abrigar os próprios projetores.

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Projetor digital. Fonte: Cineorlandia

Para melhorar a qualidade da imagem algumas salas possuem dois projetores para uma mesma tela, esses devem ser alinhados para que cada pixel da imagem se sobreponha perfeitamente!

Já as telas são dimensionadas de acordo com a proporção a ser utilizada. Até 1950 o padrão era o 1,33 (ou 4:3) também chamada de “janela clássica” e é a mesma da maioria das telas de TV e monitores de computador antigos.  Após 1950 surgiu o padrão 2,35 (ou 7:3) também conhecida como “cinemascope”, porém as mais utilizadas hoje surgiram a partir de 1960, o padrão 1,66 (5:3) e o 1,85 (13:7) conhecidos como “janela europeia” e “janela norte-armericana” respectivamente. Segue imagem comparativa do tamanho das telas e suas diferentes proporções:

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Padrões de telas de cinema. Fonte: Wikipedia

Existe ainda o espantoso padrão IMAX, conhecido como o cinema das telas gigantes. Com telas que podem ir de 22m de largura e 16 metros de altura (11:8) a até mesmo 35×30 metros na maior sala IMAX do mundo em Sydney.

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Tela Imax x Tela normal. Fonte: idgnow

É claro que o próprio tamanho das telas é limitado pelo tamanho da sala e no caso de telas realmente muito grandes até mesmo pela logística de transporte das mesmas da fábrica até o complexo de cinema aonde será instalada.

E para que a visualização da imagem não sofra nenhuma interferência são usados como revestimentos internos da salas materiais que tenham pouca reflexibilidade da luz, quase sempre em tons escuros e os corredores que dão acesso as salas, não raros, possuem duas portas para que quando se abra a segunda a primeira já tenha fechado, ou são longos e normalmente em formato de “L” quebrando assim a luz de fora que possa entrar na sala e de alguma forma iluminar a tela.

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Corredor de entrada da sala. Fonte: Grantec

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Imagem interna de sala de cinema. Fonte: Maceio40graus

Além da luz os próprios telespectadores podem atrapalhar um ao outro na visualização da tela, para evitar esse desconforto as arquibancadas são mais inclinadas, aumentando a diferença de altura entre um patamar e outro. Os ângulos de visualização da nossa visão são levados em conta no cálculo para o dimensionamento ideal das distâncias e alturas confortáveis.

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Diagrama ângulos de visão. Fonte: NBR9050

Além das salas de cinema, todo bom cinema precisa também de um bom foyer onde encontraremos a bilheteria, espaço de espera com um tamanho confortável para abrigar o público, bomboniere, cafés que, apesar de possuírem um teor técnico e tecnológico menor que o das salas de cinema, são indispensáveis para uma boa experiência de qualquer cliente.

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Foyer Cinesystem Maceió. Fonte: maceio40graus

Gostou? Ir ao cinema não será mais a mesma coisa né? Cada detalhe foi pensado para que você assista seu filme com a maior tecnologia e conforto possível. Agora é só relaxar e aproveitar a pipoca quentinha e seu filme preferido!

Texto escrito por Julian Francisco Vasconselos Piran* para o Arquitete suas Ideias

*Formado em Arquitetura e Urbanismo na Universidade Federal de Santa Catarina. Já trabalhou como arquiteto no escritório EA+ Studio e hoje trabalha como arquiteto no escritório Bittencourt Mincache Arquitetura aonde coordena projetos de complexos de cinema para as redes Cinesystem e Centerplex.

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